sexta-feira, maio 04, 2018

O rol da desonra


Sobre o processo de acusação em curso contra o ex-primeiro-ministro José Sócrates (e as ligações presumidas a processos similares contra o ex-ministro Manuel Pinho e o ex-banqueiro Ricardo Salgado), o atual primeiro-ministro, António Costa, declarou ontem que «Se essas ilegalidades se vierem a confirmar, serão certamente uma desonra para a nossa democracia».

Não, Sr. Costa! A democracia constitucional que temos não está nem ficará desonrada se se confirmarem, em sede judicial, os fundamentos destas acusações. Ela terá demonstrado, apesar de tudo, a saúde dos seus órgãos fiscalizadores e protetores da legalidade. Ela sai vencedora e mais forte por ter sobrevivido, ter identificado e se ter defendido daquela que é presumivelmente a maior e mais concertada ofensiva organizada e planeada para a captura criminosa e cleptocrática do Estado na história política portuguesa.

Quem sai desonrado é apenas um grupo de portugueses que foi conivente com aquela ofensiva, por atos ou omissões, e por baixo comportamento sectário, faccioso. Aqueles que foram e continuam a ser incapazes de condenar frontalmente, e de se demarcarem, dos crimes presumidos é que saem desonrados. Na melhor das hipóteses, fazem-no por orgulho, por saberem da solidariedade e da proteção que deram até demasiado tarde a um ex-primeiro-ministro sobre o qual existiam já suficientes suspeitas; teriam agora de admitir o sectarismo cego em que estavam e não o querem fazer.

Que a demarcação agora anunciada é tímida, insuficiente, contraditória (e, há que dizê-lo, moralmente inaceitável) é o que demonstram as infelizes e despropositadas declarações de Carlos César («José Sócrates deixou uma marca muito positiva em Portugal»).

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